A humanidade sempre foi fascinada pelos gêmeos, raros a ponto de representar apenas 0,1% dos partos entre os anos de 1980 e 1985 – Tal fascínio é comprovado pelo aumento de 42% no nascimento de gêmeos ao longo das últimas décadas, impulsionado por técnicas de reprodução assistida. Quando univitelinos, os gêmeos são praticamente idênticos, têm o mesmo sexo e genoma.
Ainda existe muita especulação sobre uma suposta conexão especial entre os irmãos, que compartilhariam sentimentos ou algo misterioso e complexo demais para se expressar em palavras. Apesar da subjetividade presente nos gêmeos humanos, a tecnologia utiliza o conceito de cópias idênticas, com precisão e eficiência, para atender a objetivos específicos através dos gêmeos digitais.
Conceitualmente, gêmeos digitais ou digital twins, são representações virtuais de sistemas, processos ou objetos reais como motores, edificações e até mesmo cidades. O termo e o conceito têm origem atribuída ao Dr. Michael Grieves, 2002.
Com a construção de uma representação virtual idêntica de algo, é possível, entre outras tarefas, realizar simulações e testes essenciais para a redução de riscos e custos na fabricação de produtos. Vale ressaltar que diferente das simulações, que ajudam a avaliar um processo específico, digital twins executam inúmeros processos ao mesmo tempo.
Apesar da especificidade do exemplo anterior, os gêmeos digitais não estão restritos à indústria. Também são utilizados nas áreas da saúde, em operações de negócios, e até mesmo estendidos a gêmeos digitais do consumidor.
Quando relacionados ao consumidor, por exemplo, dados são coletados de diversas fontes, através de interações digitais e físicas, através de dispositivos IoT em lojas, pesquisas e analytics. Assim, é possível simular com precisão a experiência do consumidor, antecipando comportamentos, ampliando a longevidade e levando a novos modelos de monetização.
Em linhas gerais, a ideia central é utilizar os gêmeos digitais para melhorar ou prover feedback à versão real do objeto de estudo. No automobilismo, equipes de ponta da Fórmula 1 como Red Bull e McLaren, utilizam gêmeos digitais de seus carros para otimizar o desempenho em altíssimo nível. Na logística, a gigante DHL se vale do recurso para otimizar seus armazéns e a cadeia de suprimentos.
Cidades inteiras, como Singapura e Xangai, também começam a ser virtualizadas, utilizando gêmeos digitais para otimizar design e operações de edificações, ruas e seus sistemas de transporte.
Em Singapura, por exemplo, o papel da virtualização é auxiliar na descoberta de novas formas de locomoção para o cidadão, de modo a evitar áreas de intensa poluição. No Oriente Médio, novas cidades já estão sendo construídas simultaneamente no mundo real e no digital.
É essencial compreender que diversas tecnologias são aplicadas para viabilizar a construção de digital twins, entre elas o Big Data, IoT, machine learning, deep learning e edge computing, por exemplo.
Tipos de Gêmeos Digitais
É possível classificá-los conforme suas aplicações e escopo, além disso, é comum que mais de um tipo esteja presente em sistemas ou processos.
Quando uma companhia possui múltiplos gêmeos, pode fazer sentido integrá-los. Em uma planta de energia conectada a dispositivos de IoT como válvulas, bombas e geradores, por exemplo, pode haver um papel para o gêmeo de cada peça, em uma composição agregando dados da estrutura. Veremos a seguir algumas definições apresentadas pela IBM.
Gêmeos de componentes / Gêmeos de partes
Eles são a unidade básica dos digital twins, representando a menor unidade de um exemplo de componente funcional. Os gêmeos de partes são similares aos componentes, mas se referem a componentes com menor importância.
Gêmeos de ativos
Quando há pelo menos duas partes trabalhando juntas, podemos qualificar um ativo (asset em inglês). Os Asset twins permitem analisar a interação entre componentes, considerando dados variados de performance que podem ser processados e, então, transformados em percepções acionáveis.
Gêmeos de sistema
Envolvendo unidades gêmeas, o nível permite a visualização de diferentes ativos, que se agrupam para compor um sistema maior e funcional. os gêmeos de sistema promovem visibilidade sobre as interações de ativos, e podem indicar pontos para melhoria de performance.
Gêmeos do processo
Aqui, no nível macro, os digital twins revelam como os sistemas atuam juntos para compor uma instalação de produção em sua totalidade. Gêmeos do processo podem avaliar, por exemplo, se os sistemas estão sincronizados e operando com eficiência, ou se o atraso de um deles causará um efeito em cascata, impactando a eficiência geral.
Quais os benefícios da utilização dos gêmeos digitais?
Vantagens na pesquisa e desenvolvimento
Maior eficiência na pesquisa e desenvolvimento de produtos por gerarem um vasto volume de dados e estimativas sobre os prováveis resultados de desempenho. Com essas informações, companhias podem chegar a insights que indiquem possíveis pontos de melhoria antes do início da produção.
Maior eficiência
Mesmo após o começo da produção de um novo produto, gêmeos digitais podem ajudar a espelhar e monitorar sistemas, visando atingir e manter níveis máximos de eficiência em todo o processo de produção.
Fim do ciclo de vida do produto
Os fabricantes podem contar com o suporte dos gêmeos digitais para decidir o que fazer, e com quais partes, dos produtos que chegam ao fim de seu ciclo de vida. Aqui, a tecnologia assume um papel essencial para a sociedade, determinando quais materiais poderão ser coletados, contribuindo para o conceito de economia circular, por exemplo.
Aplicações em destaque
Os gêmeos digitais já são utilizados de forma ampla, atualmente, em cenários como:
Geradores de energia
Grandes motores, como os encontrados em jatos, locomotivas e turbinas geradoras se beneficiam muito dos digital twins, principalmente por ajudarem a estabelecer janelas de tempo para a manutenção.
Estruturas e seus sistemas
Enormes estruturas físicas, desde construções a plataformas de perfuração offshore podem ser otimizadas com os gêmeos digitais, sobretudo em seu design. Os digital twins cumprem, ainda, um papel muito útil no design de sistemas HVAC presentes nas construções citadas, onde são responsáveis pelo Aquecimento, Ventilação e Ar-condicionado.
Operações de fabricação
Considerando a versatilidade de aplicação dos digital twins, é natural que tenham se tornado praticamente onipresentes em todos os estágios de fabricação. Neste cenário, eles orientarão desde o design até o produto final em aspectos diversos, incluindo as etapas intermediárias.
Serviços de Saúde
Assim como produtos e consumidores podem ser virtualizados, é possível fazê-lo com os pacientes que utilizam serviços de saúde. Neste caso, os mesmos dados gerados por sensores também são rastreáveis, e se relacionam a indicadores-chave, capazes de gerar valiosos insights sobre a saúde.
Indústria automotiva
Desde a produção de carros populares, até os carros mais velozes, com tecnologias restritas aos pilotos da elite mundial, gêmeos digitais promovem melhorias no desempenho e eficiência na fabricação.
Planejamento urbano
Engenheiros e profissionais envolvidos nas atividades de planejamento urbano contam com ajuda significativa dos gêmeos digitais, que exibem dados espaciais em diferentes formas, em tempo real. Além das exibições em 3D e 4D, com os digital twins também é possível, por exemplo, agregar recursos como realidade aumentada em ambientes construídos.
O que virá pela frente?
Uma pesquisa realizada pelo Gartner em 2019, já indicava números consideráveis sobre a adesão das companhias aos gêmeos digitais. O estudo sinalizou que 13% das organizações que implementam projetos de IoT já usam gêmeos digitais, enquanto 62% estavam no processo de estabelecer o uso dos digital twins ou planejavam fazê-lo.
Mesmo antes da aceleração forçada pela pandemia, a consultoria já projetava que, até 2022, mais de dois terços das companhias que implementaram IoT lançariam pelo menos um gêmeo digital.
Diante das inúmeras possibilidades, e da importância da tecnologia para a competitividade, a crescente adesão a estratégias com digital twins indica que, por mais que pareça clichê, a questão não é “se” os gestores irão utilizá-las, mas “quando” o farão.